José Carlos Pace, os títulos e como tudo começou

Sempre que se fala em Brasil na Fórmula 1, um nome vem à mente das pessoas mais distantes desse esporte: Ayrton Senna. Quem tem um pouco mais de imersão e saudosismo recorda os campeões Nelson Piquet e Emerson Fittipaldi. Os mais jovens têm na memória, muitas e injustas vezes de forma pejorativa, os vice-campeões Rubens Barrichello e Felipe Massa. Porém, mais de 30 pilotos já ocuparam um cockpit na F1 até o atual Gabriel Bortoletto.

Um deles é muito subestimado e praticamente esquecido do público em geral, a não ser quando se fala o nome real do autódromo de Interlagos: José Carlos Pace. Vencedor do Grande Prêmio do Brasil de 1975, quando corria pela Brabham e atingia seu auge técnico num carro competitivo, morreu precocemente num acidente de avião em 1977. Naquele ano, com um segundo lugar em três corridas, disputava a liderança do campeonato com o lendário Niki Lauda, de Ferrari.

Sobre Pace, o jornalista Luiz Carlos Lima escreveu o livro “José Carlos Pace – o campeão sem título”, publicado pela Editiora Gulliver.

Uma carreira de trabalho e sucesso

De cima abaixo: Mil Milhas Brasileiras, Surtees, Brabham de 1975 - a vitória no Brasil, Brabham de 1977 - as últimas corridas.

A trajetória de Pace conta uma história de muito trabalho dentro do Brasil. Trabalho na construção do automobilismo brasileiro que criaria o gigante Emerson Fittipaldi, ainda antes que Pace pudesse chegar ao automobilismo europeu – mundial, por conseguinte. Organizador, junto a outros nomes como Wilson Fittipaldi Jr. e Luís Pereira Bueno, das Mil Milhas de Interlagos, o principal evento do automobilismo nacional antes de existirem Stock Car, Fórmula Truck e todas as corridas internacionais que o país recebe, ele dedicou todos os anos 1960 e princípios dos 1970 a desenvolver corridas com regularidade no Brasil.

Entre idas e vindas, as Mil Milhas marcaram o calendário brasileiro e, hoje, são realizadas em janeiro, mas sem o brilho daquela época, com tanta concorrência de categorias mais caras e etapas mundiais realizadas no país. Mas, anteriormente, era “a corrida”, e fundamentou a chegada de vários pilotos brasileiros ao topo mundial, embora sem sucesso.

Um deles, com sucesso: ele próprio. Pace subiu à Fórmula 1, mas começou por baixo, carregando uma carroça de uma equipe chamada Surtees. O dono era até campeão mundial de F1 em 1964, mas o time com seu nome nunca emplacou.

Contudo, se Pace não mostrava resultados, porque não era possível, mostrava velocidade para andar no pelotão do meio e desafiar alguns dos primeiros, quando estes estivessem num mau dia. Por isso, chamou a atenção de Bernie Ecclestone, dono da média para grande Brabham, e que viria a ser chefe da própria Fórmula 1, no futuro. Com um carro que era talvez a quinta força da década – atrás de Ferrari, Lotus, McLaren e Tyrrell, cada ano em ordem diferente – ele teve espaço para conquistar uma vitória, sua única. Após uma temporada mediana em 1976, mostrava potencial como piloto e equipe em 1977, mas um acidente aéreo fez com que jamais soubéssemos seu futuro naquela temporada e na vida.

Por que lembrar?

A memória é injusta com os que não venceram, porque costumamos medir tudo por estatísticas. O piloto que ajudou a construir o automobilismo brasileiro, viu um atleta mais jovem chegar primeiro à glória mundial, Emerson, e ainda assim teve talento e disposição para, tardiamente, correr por uma equipe pequena, chegar a um carro competitivo e vencer uma corrida é uma baita história.

E não só uma história divertida para ser lida: é uma história importante para ser lembrada.

Recordar que marcar época não é necessariamente vencer títulos. Que a importância não se dá apenas por cima, mas pelo fundamento. E que a morte é injusta com os maiores, ainda mais quando, na Fórmula 1, ela não se dá dentro da pista. Fosse um possível campeão que se estabacou num dos muros de Zeltweg, seria uma lenda. Alguém que morreu num avião, sem ainda chegar às múltiplas vitórias ou a um título, teve sua memória definhada com o tempo, restando como nome do autódromo mais importante do país, o qual chamamos de Interlagos porque não compreendemos o nome real: “ah, deve ser um governador qualquer”.

“O campeão sem título” pode mesmo ser a alcunha de José Carlos Pace, pelo que construiu para si, chegando a uma vitória em casa, de Brabham, quando desabrochava para a Fórmula 1, seja pelo que fez pelos demais, sendo um baluarte para as corridas brasileiras.



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